Governo prevê que alíquota de 4% para ICMS atinja 83% das transações até 2016

Dentro de três anos, 83% de todas as transações interestaduais com bens e serviços estarão sendo taxadas pelo Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) com alíquota de 4%, se a proposta enviada pelo governo ao Congresso for aprovada, informou ontem o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa.

Com esse dado, Barbosa procurou rebater a crítica de que o governo adiou a implantação da unificação da alíquota interestadual do ICMS ao ampliar de oito para 12 anos o prazo de transição. “A transição será rápida”, afirmou. 

Os restantes 17% das transações interestaduais – aquelas realizadas entre os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste com os Estados das regiões Sul e Sudeste, menos o Espírito Santo – terão alíquota de 4% somente em 2025, de acordo com a proposta. Os dados foram apresentados por Nelson Barbosa, durante audiência pública realizada na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. Atualmente, as alíquotas interestaduais são de 12% e 7%. O Estado do Espírito Santo é enquadrado nas mesmas regras válidas para os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. 

Na audiência pública, os secretários de Fazenda de São Paulo, Andrea Calabi, e de Minas Gerais, Leonardo Colombini Lima, questionaram a ampliação do prazo de transição de oito anos para 12 anos e a exclusão do Estado do Amazonas da alíquota interestadual de 4%. “Se o Amazonas ficar com 12% e o restante dos Estados com 4% esqueçam, pois todas as empresas irão para lá”, disse Calabi. “O Amazonas já têm benefícios fiscais federais e ele pode até ter uma alíquota do ICMS diferenciada, mas não aceitamos os 12%”, reforçou Lima. Calabi disse que essa questão não foi discutida anteriormente com os demais Estados.

O secretário de São Paulo protestou também contra a exclusão do gás natural da alíquota única de 4%. Pela proposta do governo, o gás natural será tributado com 12% para não prejudicar o Estado do Mato Grosso do Sul, por onde o gás boliviano ingressa no país. 

Durante a audiência pública ficou evidente para os senadores que a proposta de reforma do ICMS apresentada pelo governo não reflete um consenso entre os Estados. “Vamos ser sinceros, não temos um consenso [sobre a unificação da alíquota] dentro do Confaz [Conselho Nacional de Política Fazendária]”, disse Claudio Trinchão, coordenador do órgão, que reúne os secretários estaduais. 

Todos os secretários de Fazenda do Norte, Nordeste e Centro-Oeste que estavam presentes na CAE disseram que seus Estados não aceitam a unificação da alíquota em 4%. “Manter a assimetria das alíquotas é um ponto essencial”, disse o secretário de Pernambuco, Paulo Henrique Câmara. “A reforma é um desastre para as três regiões [Norte, Nordeste e Centro-Oeste]”, reforçou o secretário de Fazenda do Ceará, Mauro Benevides Filho. “Temos que manter a diferenciação de alíquotas, pois ela é necessária”, acrescentou. A proposta desses Estados é ter uma alíquota de 7% para os seus produtos e de 4% para os produtos com origem nas regiões Sul e Sudeste. 

Eles protestaram também contra o que chamaram de “falta de segurança” com o fundo de compensação das perdas e com relação aos recursos orçamentários que o governo pretende destinar ao fundo de desenvolvimento regional. A proposta do governo prevê que apenas 25% dos recursos deste fundo virão do Orçamento. Os outros 75% serão financiamentos em condições favorecidas. “Queremos inverter isso, com 75% de recursos orçamentários”, disse o secretário de Pernambuco. 

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda observou que o governo nunca disse que sua proposta contava com o apoio do Confaz. “É impossível chegar a um acordo no Confaz”, disse. “A União procurou estruturar um consenso possível”, afirmou. Segundo Barbosa, 20 Estados ganharão com a reforma. Ele disse que um estudo feito pelo Confaz estimou a perda anual com a reforma em R$ 15,4 bilhões a partir de 2025. Nesse cálculo, no entanto, não está considerada a exclusão do Amazonas e do gás das novas regras. 

Diante das divergências entre os secretários, alguns senadores questionaram a possibilidade de acordo. “O que vemos aqui é quase um dissenso total”, afirmou o senador Waldemir Moka (PMDB-MS). “Não tem condição política nenhuma de aprovar isso [a reforma]”, acrescentou. O senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) questionou a data de 26 deste mês para votar a proposta, fixada pelo presidente da CAE, Lindbergh Farias (PT-RJ). Ele considerou o prazo muito apertado. Lindbergh garantiu que manterá a data e pediu pressa para as negociações entre os Estados. 

Hoje, os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), discutirão a reforma do ICMS e outras questões federativas, como a mudança do indexador das dívidas renegociadas pela União e o Fundo de Participação dos Estados (FPE), com os governadores.  

 

São Paulo perde R$ 55 bi com unificação do tributo 

O projeto que o governo federal enviou ao Congresso para reduzir e unificar as alíquotas do ICMS, principal tributo estadual, poderá custar R$ 55,187 bilhões a São Paulo nos próximos 20 anos. A proposta tira o Estado do grupo dos vencedores da reforma e coloca no grupo dos perdedores porque deixa de tributar a venda de gás natural, mantém uma tributação diferenciada para a Zona Franca de Manaus e amplia o prazo de redução das alíquotas. 

“O benefício à Zona Franca não foi discutido, não estava previsto e é insuportável para São Paulo”, disse o secretário da Fazenda, Andrea Calabi. “As alíquotas não podem ficar paradas por cinco anos. O custo disso é muito grande”, completou o secretário. 

As estimativas feitas pelo governo estadual consideram dois cenários. No primeiro, foram feitos os cálculos da perda de arrecadação do ICMS com base no que a União havia discutido com os secretários de Fazenda em novembro do ano passado no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). 

Se as alíquotas fossem reduzidas em um ponto percentual por ano, chegando a 4% em 2021, São Paulo teria um ganho de receita de R$ 4,857 bilhões ao fim de 17 anos. As projeções mostram que quando todas as alíquotas fossem unificadas em 4%, São Paulo passaria a ter um ganho anual de R$ 1,4 bilhões por ano. 

A outra estimativa considera o projeto que está em tramitação no Congresso e será discutido hoje em reunião com os governadores. 

Nele, o governo federal decidiu não mudar a alíquota do gás natural e mantém os produtos enviados da Zona Franca de Manaus para o resto do país tributados a 12%. Na prática, isso significa que São Paulo, para onde se destina boa parte da produção da ZFM, terá que conceder créditos de 12% às empresas que importarem da região Norte. 

Além disso, a convergência das alíquotas para os 4% é mais lenta no projeto enviado pelo governo e os Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste poderão passar cinco anos com as alíquotas estacionadas em 7%. 

Tudo isso faz com que São Paulo perca na reforma do ICMS. Mesmo depois que todas as alíquotas estiverem unificadas em 4%, o que deve ocorrer em 2025, o Estado estará abrindo mão de R$ 1,19 bilhão por ano. 

O governo federal se propõe a ressarcir os Estados pela perda de arrecadação com a mudança no ICMS, mas estabeleceu um teto de R$ 8 bilhões. Na avaliação de São Paulo o risco seria muito grande, pois há anos em que as perdas estimadas chegam a R$ 6,2 bilhões, um valor muito próximo ao que a União concorda em pagar a todos os Estados. 

A Secretaria de Fazenda de São Paulo também estimou o custo do novo ICMS para todos o país. Pelas regras anteriores, a unificação do tributo custaria R$ 140,9 bilhões até 2029. Com as alterações no projeto, a despesa subiria para R$ 221,5 bilhões até 2033. 

Com a unificação das alíquotas do ICMS a guerra fiscal acabará na prática. A discussão entre os governadores opõe os Estados do Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Espírito Santo, que não querem arriscar os benefícios fiscais já concedidos ou perder as ferramentas de atração de investimentos e o Sul e o Sudeste, que reclamam de perdas de arrecadação com a guerra fiscal. 

A proposta federal é que os incentivos já concedidos sejam legalizados por todos os Estados no Confaz. Em compensação, a União criaria um fundo de desenvolvimento regional que permitiria aos governadores ter recursos para atrair empresas a seus Estados.  

 

Dilma tenta assumir dianteira em pacto federativo 

A presidente Dilma Rousseff resolveu se antecipar e apresentar ontem ao Legislativo, na véspera da reunião dos governadores sobre o pacto federativo, os projetos sobre o assunto que aceita colocar na mesa de negociações. Com isso, o governo tenta frear o crescente protagonismo nesse tema que os seus prováveis adversários na sucessão presidencial de 2014, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), tentam assumir. 

Ontem pela manhã, a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, anunciou aos líderes da base aliada da Câmara dos Deputados quais são as quatro propostas que o governo tem interesse em negociar. Para cada um deles, inclusive, já foi mapeada sua situação legislativa e escolhido um relator. Nos próximos dias, os relatores, os presidentes das comissões onde eles se encontram, Ideli e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, devem se reunir para avaliar o conteúdo e a tramitação mais célere desses projetos no Congresso. 

Todos eles foram encaminhados pelo governo: a resolução a ser apreciada apenas pelo Senado, que trata da convergência das alíquotas de 12% e 7% para 4% em 12 anos; a medida provisória (MP) 599 de 2012, que cria os fundos de compensação e de desenvolvimento regional; e um projeto de lei complementar que altera o indexador das dívidas de Estados e municípios com a União – passa do Índice Geral de Preços (IGP-DI) para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA). Os relatores serão, respectivamente, o senador Delcídio Amaral (PT-MS); o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ); e o senador Walter Pinheiro (PT-BA). 

“Na semana que vem reuniremos todos os relatores com o ministro Mantega e também os presidentes das comissões onde os projetos tramitam para avançarmos”, disse Ideli. Para ela, “essa é a posição que o governo já encaminhou ao Congresso” sobre o pacto federativo. Ela mencionou ainda outro projetos relacionados ao pacto federativo que o governo concorda em acelerar. Um deles, a proposta de emenda constitucional (PEC) que altera a cobrança de tributos sobre o comércio eletrônico. 

Ainda assim, não foi suficiente para que Aécio e Campos recuassem. À tarde, o tucano voltou a discorrer sobre pacto federativo durante um evento partidário na Câmara cujo objetivo era contestar a gestão petista à frente da Petrobras. Campos tão logo desembarcou em Brasília, programou os encontros com alguns governadores, como o de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD), entusiasta de sua candidatura presidencial em 2014. 

O problema é que, no geral, seus discursos coincidiam em certo grau com a pauta manifestada pelo governo. O tucano disse que a intenção do PSDB é apresentar uma proposta que limite em 9% da receita o máximo possível a ser direcionado para pagamento da dívida. Também defendeu um fundo de investimentos para os Estados. 

Interlocutores de Campos disseram que o PSB é entusiasta da ideia de aumentar a capacidade de investimento do Estado para que, assim, possa ser ampliado o volume possível de saques.  

 

Fonte: Valor Econômico